domingo, 28 de março de 2010

Amores e tropeços de Sylvia Loeb

Amores e tropeços
de Sylvia Loeb


168 páginas

A psicanalista Sylvia Loeb cria instantâneos da vida cotidiana em que as personagens são flagradas no momento exato em que o embate amoroso, com seus gozos e tombos, se dá – entre os seres, no interior dos seres. Neles, angústias, desejos, silêncios, dores e pulsões de vida e morte são transformados em literatura pela pena habilidosa e sensível da escritora.

Para Sylvia, também autora de Contos do Divã – pulsão e morte e outras histórias, lançado em 2007 pela editora Ateliê, os contos de Amores e Tropeços trazem o corpo como palco privilegiado da luta amorosa “Um movimento de alma ou de uma instância psíquica pode até ser o estopim dessa luta, mas é quando o pensamento chega à carne, à pele ou ao estômago que se vislumbram as questões essenciais de cada ser humano”.

Em seu livro Amores e tropeços, a psicanalista Sylvia Loeb cria instantâneos da vida cotidiana em que as personagens são flagradas no momento exato em que o embate amoroso, com seus gozos e tombos, se dá – entre os seres, no interior dos seres. Neles, angústias, desejos, silêncios, dores e pulsões de vida e morte são transformados em literatura pela pena habilidosa e sensível da escritora.

Para Sylvia, também autora de Contos do divã – pulsão e morte e outras histórias, lançado em 2007 pelo Ateliê Editorial, os contos de Amores e Tropeços trazem o corpo como palco privilegiado da luta amorosa: “Um movimento de alma ou de uma instância psíquica pode até ser o estopim dessa luta, mas é quando o pensamento chega à carne, à pele ou ao estômago que se vislumbram as questões essenciais de cada ser humano”.


Trechos do livro

O que ela mais queria
era ter um pinto. Tinha três irmãos, era a única menina na família. Mimada, querida, a mais novinha. Queria ter um pinto. Igual ao dos irmãos. Eles subiam na janela e faziam concurso de quem mijava mais longe. Ela ficava olhando, queria fazer igual. Treinava, fazia xixi em pé, um fiasco, tudo escorrendo pelas perninhas, morninho, sapatos e meias molhados. Os irmãos caçoavam, um até ajudou a fazer uma geringonça de papelão, uma espécie de funil pelo qual o xixi passaria para mijar longe. Mas perdia a força, o jato virava aguinha boba. A mãe preocupada, você quer ser menino? Não mãe, só queria ter um pinto para mijar longe! Não fale assim, menina, fala fazer xixi. Pois eu queria mijar bem longe, mãe!
Cresceu, estudou, viajou, namorou, casou, teve filhos, viveu feliz com o desejo insatisfeito – mas não esquecido – de ter um pinto, de ter algo pontudo, que aparecesse por fora do corpo. Fez uma plástica no nariz. De aumento.

O umbigo de Isaura
era mágico. Se a gente olhasse com atenção, sem pensar em mais nada, ele se abriria feito calidoscópio. Cores diversas, desenhos geométricos se alternavam, conforme o movimento maravilhado dos olhos. Com paciência, a paisagem se transmutava. Inicialmente em floresta densa e muito verde, depois em praia, mar e montanha, paisagem lunar também. Às vezes tempestade; outras, terremoto. Até chuva de granizo. Isaura tinha de ficar quieta, respirando devagar e pausadamente, expondo seu umbigo mágico a quem elegesse. Ao menor vacilo do expectador, a paisagem se fechava, e o umbigo surgia na sua banalidade habitual, no meio da barriga. Isaura baixava a blusa e nunca mais o mostrava.

No ponto do ônibus,
a menina novinha, hormônios brotavam em espinhas e seios já fartos, cheiro de suor; pelos dourados cobriam seus braços e pernas grossas bem torneadas. Chegou o vizinho, alguns anos mais velho, cigarro na boca, fumaça nos olhos, músculos explodindo na camisa apertada. Olhou para ela e disse bom-dia com voz grave. Jogou o cigarro no chão, apagou-o com o pé num gesto sinuoso da perna comprimida na calça negra. Olhou longamente para seu corpo e correu para pegar o ônibus. Ela ficou ali. Siderada, vexada, abandonada.
Um Lançamento

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